Facing the Challenges: Equity, Sustainability and Access
A Vita participou da Conferência Internacional Facing the Challenges: Equity, Sustainability and Access, que aconteceu nos dias 29 e 30 de novembro em Lisboa – Portugal, sob organização do Infarmed com a WHO Europa.
A Conferência foi assertiva em juntar uma visão ampla da Europa, pois trouxe não só o que está sendo discutido a nível dos 28 países membros da EU, mas também a visão continental representada pela WHO Europa. Foram exposições breves (30 min/apresentação) de 24 experts com o objetivo de promover discussões focadas nos desafios modernos que a Gestão Pública de Saúde enfrenta com as terapias inovadoras. O tema é atual, complexo e ainda com alto grau de incerteza das medidas para solucionar esses desafios.
Diante de uma situação em que há mais interrogações do que afirmações, o diálogo foi aberto e franco ao deixar claro que o sistema público de saúde não consegue mais evoluir se for sozinho. Sabe aquele ditado africano “Se quer ir mais rápido vá sozinho, mas se quiser ir mais longe, vá em conjunto”? Pois bem, o ditado foi muito bem colocado pela Sra. Hanne Paderson da WHO e resume bem a motivação da Conferência.
A Conferência é uma prova de que as Autoridades mais maduras estão atentas à Ciência Regulatória (se você ainda não viu o post da VITA sobre o assunto click aqui) e os palestrantes foram unânimes em expor que as ferramentas de gestão hoje existentes não são mais compatíveis com o nível de avaliações de benefício-risco e custo-efetividade de terapias inovadoras. Os produtos parecem ser avaliados cada vez mais caso a caso, pois a inovação supera diariamente os padrões regulamentares de avaliação e além disso, a ineficiência do sistema é confirmada por dados estatísticos simples: pagamos cada vez mais caro por terapias, mas o retorno de efetividade terapêutica (cura e ganho de vida) não cresce na mesma proporção. E agora José? Bem, nem a Vita, nem eles, nem José sabemos o que fazer, mas vamos compartilhar com vocês um pouco dessa Conferência que foi muito enriquecedora.
O tema de acesso é amplo, pois é uma área que sofre impacto de ações tomadas em Tecnologia da Saúde (HTA), gestão de recursos, sustentabilidade, negociações econômicas, Horizon Scanning, colaboração …. ad infinitum. ???? Mas a princípio os discursos deixaram claro que a Tecnologia da Saúde é o caminho atualmente escolhido para dar foco à melhoria do acesso às novas terapias.
Ao avaliar dados do mundo real geram-se evidências, o que é conhecido como RWE (Real World Evidence) ou PLEG (Post-Launch Evidence Generation), que auxiliam na tomada de decisão das Autoridades Públicas para reconhecerem as terapias com melhor desempenho além do cenário controlado de estudo clínico, conseguindo assim priorizá-las em cada área terapêutica. Dados como quantidade de prescrição dimensionam as consequências de uso, seja pelos benefícios ou pelos efeitos adversos, além de sinalizar um custo-benefício dos recursos que foram investidos para cada medicamento. Um exemplo de como isso foi aplicado, foi apresentado pela Sra.Chantal Bélorgey, membro da Haute Autorité de Santé – HAS, da França. Ela explicou que a HAS avaliou os dados nacionais de uso de anticoagulantes e as evidências geradas indicaram que era preciso alterar os protocolos médicos existentes, a fim de otimizar os recursos hospitalares, para conseguirem o melhor desempenho possível. Entretanto, avaliar esses dados não parece nada fácil e todas as vozes parecem concordar que ainda se questiona sobre a qualidade, potencial viés dos bancos de dados, dependência do engajamento da classe médica para imputar os dados e principalmente, a necessidade de haver líderes que coordenem os estudos de Tecnologia da Saúde nas Autoridades.
Enquanto a HTA tenta trazer evidências claras do que está acontecendo nesse momento o Horizon Scanning tenta extrapolar os dados e prever as demandas do futuro (comente em nossa página no LinkedIn se você quiser que a VITA faça um post exclusivo para esse assunto). É uma técnica também de avaliação sistemática, mas que busca identificar as ameaças e oportunidades em potencial, determinando o que é constante, o que muda e o que muda constantemente. No caso da inovação, o Horizon Scanning visa destacar importantes inovações tecnológicas farmacêuticas e médicas antes que elas cheguem ao mercado, reunindo continuamente dados e analisando pesquisas e publicações. Isso melhora a percepção dos custos esperados e permite a tomada de decisão em tempo hábil e uma negociação em paralelo dos preços.
Perceba que toda essa história de HTA e Horizon Scanning é algo muito novo e não há métodos definidos de como implementá-los na prática. O que evidencia que a necessidade atual do Sistema de Saúde não é só de produzir medicamentos com qualidade (que por muito tempo sugou esforços das Autoridades para implementação de CBPF, TSE, Comitês de Ética, auditorias, harmonizações internacionais, etc.), mas direcionar os recursos para uma produção e consumo mais sustentável. A sustentabilidade é uma palavra-chave porque o sistema público de saúde do jeito que está desenhado hoje não consegue mais ser sustentável. Muito é produzido, muito é investido em tecnologia, mas pouco retorna em benefício à saúde social.
A discussão da sustentabilidade é dúbia. O tratamento da Hepatite C, por exemplo, despertou a Europa a avaliar se realmente o que a indústria estava cobrando pelo medicamento valia a pena ser pago. Enquanto a análise custo-efetividade das terapias atuais demonstra que os preços não são justos e são capazes de consumir todo o orçamento de um sistema público de saúde de uma só vez, tem-se o outro lado da indústria que alega o alto investimento durante os 15 anos de desenvolvimento e que devem ser ressarcidos por isso. E aí entra o outro assunto da Conferência: a Equidade.
A Conferência propôs discutir 3 temas principais: Acesso, Sustentabilidade e Equidade. Se falar de acesso e sustentabilidade já foi cauteloso, não precisamos nem dizer como foi falar em equidade. É uma questão quase que subentendida dos outros temas, que muitos consideram como bom senso, mas o assunto precisa ser retirado das entrelinhas, precisa ser encarado a fim de permitir uma regulamentação, uma vez que sem regulamentação, não há como o sistema controlar e garantir que haja acesso justo. Entretanto, a ideia não pode ser em definir o que é justo para cada personagem desse sistema, mas sim pensar nas medidas para tornar a diferença de equidade menor entre cada personagem.
A precificação então é um gargalo do sistema público e como diz o provérbio africano, é preciso lidar com isso juntos. Por isso a Europa vem formando grupos colaborativos entre as regiões com orçamentos e sistemas mais semelhantes para terem força em negociar preços. Nesse contexto entraram as apresentações referentes ao que tem sido feito de Colaboração Regional (Beneluxa, Valetta, Nordic, Finose e Visegrád). Esses grupos de países se uniram para tentar dialogar com as Indústrias Farmacêuticas e aumentar o poder de negociação de preços mais acessíveis para a população e claro, para o Governo. Mas os acordos de confidencialidade são extremamente rigorosos e nada foi falado de quais as medidas que estão sendo tomadas e experiências de sucesso. Entretanto discutiram bastante sobre os desafios da área, e a falta de transparência como consequência dessa extrema confidencialidade foi um problema citado por todos. Como discutir se não se pode abrir o que está sendo discutido? Como saber se o preço cobrado é justo se não é aberto o que é gasto em cada parte do desenvolvimento?
Enfim, muita informação para 2 dias não é mesmo? Esperamos ter estimulado em você a inquietude de que a área da saúde, com a qual trabalhamos, já está mudando, e pra melhor! Olhar apenas para a qualidade do medicamento não vai ser mais o maior requisito, se não o requisito mínimo. As discussões ao nível global agora envolvem levar as terapias a quem precisa e identificar o que ainda é preciso. A inovação precisa ser orientada, seja em tecnologia farmacêutica per se ou na perspectiva de como gerir a saúde moderna.