Um resumo da atual situação do Brexit e EMA na área da saúde
Hoje decidimos compartilhar com vocês um resumo da atual situação do Brexit com relação à EMA e os impactos causados até então, e que possam ainda estar por vir.
À medida que a saída do Reino Unido da União Europeia se aproxima, os profissionais do setor regulado especulam sobre como isso afetará a posição do país como potência mundial na área da saúde, além das consequências na regulamentação e mercado europeu.
A sede da Agência Europeia de Medicamentos (EMA) mudou de Londres para Amsterdã, mas é a mudança da atual e estreita relação entre a Agência Reguladora de Medicamentos e Produtos de Saúde (MHRA) do Reino Unido e a EMA que preocupa. Estima-se que cerca de 300 funcionários não sejam realocados para a nova sede e a perda desses profissionais experts gera o receio de fragilização da qualidade da renomada EMA.
Referente à Farmacovigilância, os profissionais da MHRA eram responsáveis por captar um terço de todos os eventos adversos na Europa e teme-se a perda de dados de segurança do paciente com o rompimento dos laços. Para mitigar o problema a EMA exigiu que os técnicos transfiram seus conhecimentos acumulados em suas áreas de especialização para seus pares de trabalho. Mas como transferir anos de conhecimento em tão pouco tempo?
A indústria farmacêutica prevê ainda possíveis implicações do desalinhamento regulatório com as normas da UE e o impacto nos cronogramas de lançamento de produtos e tempos de aprovação. A Sanofi, por exemplo, foi rápida em apontar que a Grã-Bretanha pode perder prioridade em projetos de lançamento de produtos, caso o Brexit resulte em burocracia adicional. “Se o Reino Unido exigir uma submissão regulatória separada, o mercado se alinharia automaticamente atrás dos EUA e da UE para lançamentos de produtos da mesma maneira que vemos para outros mercados maduros que possuem suas próprias estruturas regulatórias distintas como Canadá, Austrália e Suíça. Isso significa que a entrada no mercado para novos produtos provavelmente ocorrerá mais tarde do que no passado, com o resultado de que os pacientes terão que esperar mais”, lamenta o presidente do Comitê Brexit da Sanofi e diretor administrativo do Reino Unido, Hugo Fry.
O Brexit está custando às empresas farmacêuticas altos gastos e perdas de patentes, por isso líderes do setor farmacêutico alertaram que são insuficientes os preparativos do governo para a iminente mudança. A AstraZeneca, por exemplo, anunciou que parou o investimento no Reino Unido devido à falta de clareza sobre as regulamentações comerciais durante esse período de incerteza do Brexit. “Se um acordo de transição não deixar claro o que acontecerá no futuro, manteremos nossa decisão de não investir”, disse Leif Johansson, presidente não executivo da companhia, ao jornal francês Le Monde. “Um acordo Brexit precisará garantir que a Grã-Bretanha não se torne uma ilha isolada no meio do Oceano Atlântico”, continuou ele.
Os fabricantes de medicamentos já gastaram 40 milhões de libras (53 milhões de dólares) em preparação para uma situação de não acordo. “Nos negócios, a incerteza geralmente força você a tomar decisões. Mas o que é frustrante é ter que fazê-lo quando o sistema existente funciona muito bem”, disse Johansson. “Isso está nos custando dinheiro e não nos traz nenhum benefício.”
O governo britânico passou o ano de 2018 tentando mitigar o potencial dano à saúde caso as decisões resultem em uma separação difícil e sem negociação. Algumas empresas já estavam se preparando para essa eventualidade quando receberam o aviso do governo para ampliarem o estoque de seus medicamentos para suprir, no mínimo, 6 meses. Por mais que o esforço amenize os riscos para alguns medicamentos, os fabricantes de medicamentos biológicos, por exemplo, são atualmente incapazes de cumprir a solicitação de armazenamento, pois faltam instalações de câmaras frias para tamanho estoque e nos portos fronteiriços, o que pode afetar o comércio de produtos biológicos no caso de embarques na alfândega. A indústria farmacêutica pediu ao governo britânico para aumentar a capacidade de armazenamento, com o apoio na construção de mais câmaras frias, mas é questionável que tais possam ser disponibilizadas até Março de 2019.
A Comissão Europeia publicou um regulamento detalhando como quer que a indústria use códigos de barras 2D (datamatrix) e dispositivos anti-adulteração para proteger a cadeia de fornecimento de medicamentos. A nova legislação entra em vigor no dia 9 de fevereiro de 2019 e a EMA pede que as empresas cumpram com urgência para evitar risco de falsificações. No aviso, as autoridades europeias esperam que os titulares de registro de medicamentos (na Europa chamados “Titulares da Autorização de Introdução no Mercado – TAIM) adicionem as características de segurança mencionadas e atualizem os seus dossiês de registro com informações sobre as tecnologias.
Os planos de contingência são diversos e visam cobrir uma ampla gama de eventualidades, pois não se sabe se os acordos gerarão consequências leves ou graves. A preocupação é maior em torno do que é denominado “Hard Brexit“, em que o Reino Unido abriria mão do acesso total ao mercado único e ao pleno acesso da união aduaneira juntamente com a UE. Jeremy Thorpe, da Tillotts, confidencia que “Se tivermos um ‘Brexit Difícil’, prevejo que mudanças serão necessárias, já que o status regulatório dos produtos no Reino Unido vai mudar. As autorizações de comercialização detidas na Europa terão de ser transferidas para o Reino Unido e vice-versa. A liberação de lote terá que ser conduzida no Reino Unido e haverá implicações no imposto (IVA), pois o status da alfândega será alterado, podendo haver atrasos na liberação alfandegária e desincentivos para o fornecimento ao Reino Unido”.
Entretanto Richard Erwin, da Roche, é mais otimista. “Do ponto de vista comercial, temos que aceitar a decisão do Brexit e trabalhar para aproveitá-la ao máximo. O impacto na Roche provavelmente será limitado. Fabricamos na Suíça e nos EUA exclusivamente, por isso, já estamos importando nossos produtos de um terceiro país com padrões de alta qualidade. Nosso papel no Reino Unido consiste em garantir que tenhamos um suprimento contínuo e estamos confiantes de que, trabalhando em estreita colaboração com o governo, isso pode ser alcançado”.
O governo do Reino Unido deu um passo importante para proteger os pacientes, ao concordar em reconhecer e usar medicamentos e vacinas licenciados e fabricados na UE e o mesmo está sendo negociado para que o outro lado da relação, a Comissão da UE assine o acordo. Como declarado por Mike Thompson “um cenário de ‘não acordo’ não é do interesse dos pacientes. Ambos os lados devem concordar rapidamente com os termos da retirada do Reino Unido e promover um relacionamento baseado na cooperação, para proteger a saúde pública, controlar doenças infecciosas e gerenciar a segurança dos medicamentos”.
Políticos britânicos votaram, em Julho de 2018, para que o Reino Unido permaneça perto da EMA depois do Brexit. O governo britânico disse repetidamente que deseja manter laços estreitos com a EMA, culminando na publicação de um white paper que prevê que ele continue sendo um “participante ativo” na agência. No entanto, enquanto a votação leva o governo a tentar manter proximidade, não está claro se o relacionamento político é possível. Os negociadores da UE têm subestimado consistentemente a perspectiva de que o Reino Unido permaneça intimamente envolvido. O desacordo centra-se nas implicações das linhas vermelhas traçadas pelo governo do Reino Unido, que entraram nas negociações para acabar com a livre circulação de pessoas e o envolvimento do Tribunal Europeu de Justiça nos seus assuntos.
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